Nos últimos anos, o Brasil tem vivido uma transformação profunda nas relações de trabalho: milhões de pessoas deixaram de ter carteira assinada (CLT) e passaram a trabalhar como Pessoa Jurídica (PJ). Essa tendência, que vem crescendo desde a reforma trabalhista de 2017, se acelerou após a pandemia e hoje atinge praticamente todos os setores — inclusive áreas que antes eram fortemente reguladas, como logística, comunicação e o próprio serviço postal.
Reportagens e notas oficiais apontam que, entre 2022 e meados de 2025, entre 4,8 e 5,5 milhões de vínculos formais migraram para regimes PJ ou MEI, segundo matéria da Folha de S. Paulo (31/10/2025). Diante desse cenário, autoridades federais já abriram investigações sobre suspeitas de fraude, especialmente quando a relação é, na prática, de emprego subordinado disfarçado.
Em um primeiro olhar, pode parecer algo moderno, “empreendedor”. Mas, por trás do discurso da flexibilidade, a pejotização representa um grave risco de perda de direitos e de enfraquecimento da Previdência Social — e, nos Correios, ameaça direta à estrutura pública e ao trabalho digno.
O que é a pejotização
Pejotização é o nome dado ao processo em que uma empresa deixa de contratar empregados com carteira assinada e passa a exigir que eles abram CNPJs para prestar o mesmo serviço. Na prática, o trabalhador continua fazendo as mesmas atividades, sob as mesmas ordens e metas, mas sem as garantias da CLT.
É o famoso caso em que o trabalhador tem patrão, tem horário e tem metas, mas não tem direitos.
Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), esse tipo de prática pode configurar fraude trabalhista, já que disfarça um vínculo de emprego sob aparência de “prestação de serviços”.
Quais direitos o trabalhador perde
Ao ser obrigado a virar PJ, o trabalhador perde:
- 13º salário e férias remuneradas;
- Depósito do FGTS e seguro-desemprego;
- Contribuição patronal ao INSS, que garante aposentadoria e benefícios;
- Estabilidade mínima e amparo em caso de doença, acidente ou gravidez;
- E, principalmente, o poder de negociação coletiva que os sindicatos garantem.
Além disso, muitos trabalhadores PJ acabam contribuindo menos para a Previdência, o que reduz o valor da aposentadoria e aumenta o risco de ficar sem proteção futura.
Impacto direto na Previdência
A reforma da Previdência, aprovada em 2019 (Emenda Constitucional 103/2019), prometia “salvar o sistema” com novas regras. Mas ela se baseava em uma suposição: que a maioria dos brasileiros continuaria contribuindo regularmente.
O que está acontecendo é o contrário. Com o avanço da pejotização, milhões deixam de recolher contribuições integrais, o que reduz drasticamente a arrecadação do INSS e ameaça a sustentabilidade do sistema público de aposentadorias.
Autoridades do Ministério da Previdência e do Trabalho têm alertado para perdas anuais bilionárias se a pejotização continuar crescendo. Segundo audiência pública realizada em 2024 na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, a substituição de apenas 10% dos trabalhadores CLT por PJ poderia causar perda de cerca de R$ 47 bilhões por ano na arrecadação da Previdência.
Em outras palavras: a pejotização corrói a base que sustenta o sistema previdenciário e abre caminho para novos cortes ou privatizações no futuro.
Como isso afeta os Correios
Nos Correios, o efeito da pejotização se manifesta de forma indireta, mas profunda:
- Pressão sobre o modelo público — empresas privadas que usam mão de obra PJ conseguem operar com custos muito menores e pressionam a ECT a competir em condições desiguais.
- Risco de terceirização crescente — para “acompanhar o mercado”, gestores acabam defendendo mais contratos terceirizados, reduzindo concursos e vínculos celetistas.
- Ameaça à universalidade do serviço postal — as empresas privadas priorizam regiões de maior rentabilidade, enquanto os Correios precisam atender todo o território nacional.
- Precarização do ambiente interno — o discurso de “modernização” pode ser usado para justificar metas excessivas e flexibilizações internas, aproximando a estatal do modelo PJ sem vínculo direto.
Ou seja: não é que os trabalhadores dos Correios estejam migrando em massa para o setor privado, mas o avanço da pejotização pressiona o modelo público e empurra a empresa para a mesma lógica precarizada.
Esses riscos já foram apontados em análises do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) e em estudos acadêmicos da Unicamp (Instituto de Economia) sobre o impacto da uberização e da informalidade nos serviços públicos.
Quem ganha e quem perde
Perdem: os trabalhadores (sem direitos e sem proteção), a Previdência (com menor arrecadação), e a população (com serviços piores e mais caros).
Ganham: empresários que reduzem encargos e governos que enxugam estatísticas de desemprego à custa da precarização.
Mas é uma vitória de curto prazo. No longo prazo, o país inteiro perde, porque sem trabalhadores protegidos não há Previdência, não há consumo e não há Estado forte.
O que pode ser feito
Algumas medidas podem frear essa destruição:
- Fiscalização rigorosa do Ministério do Trabalho para reclassificar vínculos disfarçados;
- Auditorias públicas nos contratos dos Correios e empresas parceiras;
- Exigência de conformidade trabalhista em todas as terceirizações da ECT;
- Campanhas sindicais de conscientização, mostrando que “ser PJ” não é ser livre — é ser desprotegido;
- Revisão tributária e contributiva, para equilibrar encargos e evitar que o modelo PJ continue sendo usado como atalho para fraudar vínculos.
O papel dos sindicatos
O movimento sindical tem um papel essencial neste momento: denunciar, mobilizar e conscientizar. É preciso explicar à sociedade que a pejotização não é modernização — é precarização com nome bonito.
Defender a CLT e os direitos conquistados não é nostalgia. É defender o presente e o futuro de quem trabalha.
Defender a CLT é defender o futuro da ECT e do Brasil
A pejotização em massa ameaça a espinha dorsal do trabalho formal no Brasil. Ela fragiliza o trabalhador individualmente e enfraquece, coletivamente, todo o sistema de proteção social que o país levou décadas para construir.
Nos Correios, o risco é ainda maior: o avanço desse modelo pode forçar a empresa a adotar práticas privadas, com terceirizações crescentes e menor estabilidade. Isso abre o caminho para a privatização total e enfraquece o caráter público da ECT.
Resistir à pejotização é, portanto, defender os direitos, o serviço público e a dignidade de quem faz os Correios acontecerem todos os dias.
✍️ Por Junior Solid
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