Os holofotes estão voltados novamente para os Correios. O Conselho de Administração aprovou um empréstimo gigantesco, destinado a socorrer a estatal em um momento crítico. Mas entre o discurso oficial e a realidade da categoria, há um abismo que não pode ser ignorado.
A empresa fala em “salvar o caixa” e “garantir viabilidade”. Já para quem veste a camisa amarela todos os dias, a história soa diferente: reestruturação, cortes, ajustes… e nenhum sinal de reposição salarial, muito menos recuperação da inflação.
O futuro da empresa pode até estar no centro do debate — mas o futuro do trabalhador, esse ninguém está discutindo.
O que diz a decisão recente dos Correios
Segundo o Primeira Hora Extra deste sábado, o Conselho de Administração deu aval para um empréstimo de R$ 20 bilhões. O dinheiro virá de um consórcio de bancos privados — Banco do Brasil, Citibank, BTG Pactual, entre outros.
O objetivo declarado é óbvio: tirar a empresa do sufoco financeiro e cumprir etapas estruturantes do plano de reestruturação.
Mas vamos lembrar um ponto essencial: nenhum centavo desse dinheiro é para recompor salários, muito menos para valorizar o corpo funcional. O foco é exclusivamente a saúde financeira da estatal.
Por que esse empréstimo acende um alerta vermelho?
A resposta está nas entrelinhas do próprio plano de reestruturação:
1. Cortes de custos — e sabemos onde isso costuma bater
Quando uma estatal fala em cortar gastos, quem sente primeiro é a base. Isso historicamente significa:
- Fechamento de unidades
- Redução de quadros
- Pressão e acúmulo de funções
- Aumento de metas impossíveis
- Transferências compulsórias
- Terceirização de setores-chave
A experiência mostra: quando o aperto vem, nunca começa pelos altos salários ou pelos consultores.
2. Automação e reorganização
Sim, modernizar é necessário. Mas sem planejamento humano, vira um festival de sucateamento interno. As máquinas substituem tarefas, mas quem sobra é pressionado para fazer o mesmo trabalho de três.
3. Venda de imóveis e ativos estratégicos
A promessa de “otimizar recursos” pode esconder a velha prática: enxugar estruturando para capitalizar a empresa — com impacto direto na operação e no cotidiano de quem trabalha.
4. Nenhuma garantia para o trabalhador
Até o momento, não há:
- promessa de reposição inflacionária;
- política de valorização;
- plano de cargo;
- melhorias nas condições de trabalho;
- salvaguardas para evitar demissões indiretas.
Ou seja: reestrutura-se a empresa, mas não se reestrutura a vida de quem a carrega nas costas.
O momento é decisivo — mas não para os trabalhadores
A alta administração dos Correios fala em um “momento histórico”. E é mesmo — só que por outro motivo:
- A empresa está sendo salva.
- A operação será reorganizada.
- Os bancos receberão garantias sólidas.
- O governo evita o desgaste de uma crise maior.
Mas e o trabalhador?
Esse vai sentir o impacto na prática: mais exigência, menos estabilidade operacional, mais medo, mais incerteza — e zero participação real nas decisões.
Vista com olhos tradicionais (e de quem conhece a história da categoria), a situação lembra o velho ditado das oficinas dos anos 80:
"Quando o patrão começa a falar em modernização, é bom segurar o boné."
E agora? O que fazer enquanto categoria?
Aqui entra o lado visionário da luta sindical — aquele que projeta futuro sem esquecer a memória da classe. Altos e baixos fazem parte, mas é nos momentos de crise que o trabalhador precisa estar mais esclarecido e mobilizado.
É urgente:
- Pressionar por transparência na reestruturação;
- Cobrar garantias de que não haverá precarização;
- Acompanhar de perto qualquer reorganização de unidades;
- Reafirmar que a estatal só existe porque há carteiros, atendentes, operadores e técnicos fazendo a engrenagem girar todos os dias.
Se a empresa quer salvar-se, ótimo. Mas não pode fazê-lo às custas do trabalhador — novamente.
Conclusão
O empréstimo bilionário dos Correios pode até garantir a sobrevivência da estatal. Mas é preciso repetir a verdade que poucos ousam dizer:
este é um momento decisivo para a empresa — mas não para quem trabalha nela.
Sem valorização, sem reposição salarial, sem diálogo real e com uma reestruturação pesada prestes a cair sobre a categoria, o risco é grande de que o "salvamento" da empresa signifique apenas mais sacrifício dos trabalhadores.
E como todo carteiro experiente sabe: quando a tempestade é anunciada, não adianta confiar no guarda-chuva do patrão. É hora de ficar atento — e firme.

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