A entrevista de Fernando Haddad ao O Globo trouxe uma frase que ganhou manchetes, mas também acendeu um alerta vermelho entre os trabalhadores dos Correios:
“Vai ter que ter uma reinvenção dos Correios.”
À primeira vista, o discurso parece moderno, técnico e até inevitável. Mas, olhando com atenção — e com memória histórica — a fala carrega uma contradição profunda: parte do rombo que hoje é usado como justificativa para a tal “reinvenção” foi provocada por decisões do próprio governo, especialmente na área econômica.
Este texto faz uma análise completa da entrevista, expõe o que Haddad realmente disse sobre os Correios e aponta o que ficou convenientemente fora do discurso oficial.
O que Haddad disse na entrevista – o resumo essencial
Na entrevista, Haddad aborda três grandes eixos:
- Eleições de 2026: admite que pode deixar o Ministério da Fazenda para colaborar diretamente com a campanha de reeleição de Lula, sem pretensão de ser candidato.
- Economia e fiscal: atribui o déficit atual às heranças dos governos Temer e Bolsonaro, criticando a seletividade da mídia e do mercado financeiro.
- Estatais: reconhece dificuldades em duas empresas específicas — Correios e Eletronuclear — sendo os Correios o caso mais grave.
É nesse terceiro ponto que mora o problema.
Correios no centro da crise: o que Haddad reconhece
Haddad faz uma radiografia dura da empresa:
- Reconhece um rombo próximo de R$ 10 bilhões.
- Afirma que o problema ficou claro após uma análise detalhada feita com a nova diretoria.
- Confirma a articulação de um empréstimo via Tesouro, condicionado a um plano rigoroso de reestruturação.
Até aqui, nada que os trabalhadores já não soubessem.
O ponto omitido: a “taxa das blusinhas” e o golpe no caixa dos Correios
O que Haddad não assume na entrevista é central para entender o problema.
A criação da chamada “taxa das blusinhas”, combinada com a abertura do mercado internacional para empresas privadas de entrega, representou um duro golpe nos Correios.
Antes da medida:
- Os Correios tinham praticamente a exclusividade na logística internacional de pequenas encomendas.
- Essa operação era uma fonte estratégica de receita, que ajudava a sustentar a universalização do serviço postal.
Depois da medida:
- Empresas privadas passaram a operar livremente no mercado internacional.
- Os Correios perderam espaço de forma acelerada.
- A participação de mercado caiu de cerca de 80% para algo próximo de 30%.
Ou seja: o filé foi entregue ao setor privado.
Concorrência desigual: o velho problema com roupa nova
Enquanto as empresas privadas:
- Escolhem rotas lucrativas
- Não têm obrigação de atender áreas remotas
- Não sustentam serviços deficitários
Os Correios continuam:
- Com obrigação constitucional de universalização
- Atendendo periferias, zonas rurais e rincões do país
- Sendo cobrados como se competissem em igualdade de condições
Isso não é livre concorrência. É concorrência viciada.
“Reinvenção”: modernização ou transferência de responsabilidade?
Quando Haddad fala em reinvenção, ele aponta caminhos conhecidos:
- Agregação de novos serviços
- Parcerias com bancos públicos, como a Caixa
- Uso da capilaridade dos Correios para serviços financeiros, previdenciários e seguros
Nada disso é novo. Esse modelo existe em vários países.
O problema é outro:
Não se pode estrangular financeiramente uma estatal e depois exigir que ela se reinvente sozinha.
Na prática, o discurso soa como:
“Criamos o problema, agora vocês que se adaptem.”
A história já contou esse filme
O roteiro é antigo e conhecido pelos trabalhadores:
- Retira-se mercado e receita
- Amplia-se o déficit
- Declara-se o modelo “insustentável”
- Vem a reestruturação
- Depois, o enxugamento
- Em seguida, a precarização
- E, no limite, a privatização fatiada
Muda o governo, mudam os termos, mas o método é o mesmo desde os anos 1990.
Correios não precisam de discurso — precisam de justiça
A crítica é legítima e necessária.
- Falar em reinvenção sem assumir responsabilidade pelas decisões que retiraram mercado dos Correios é, no mínimo, desonesto.
- Não é aceitável abrir o mercado internacional às privadas e depois cobrar milagre da estatal.
- Os Correios não quebraram sozinhos — foram empurrados para essa situação.
Se há algo a reinventar, começa por:
- Rever a política de encomendas internacionais
- Restabelecer o papel estratégico dos Correios
- Garantir concorrência justa
- Colocar os trabalhadores no centro das decisões
Correios não são startup.
São patrimônio nacional.
E patrimônio não se vende nem se desmonta — se fortalece.
✍️ Por Junior Solid
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